segunda-feira, 5 de abril de 2010

Os Martires da Fé - O Martírio de Telêmaco



Durante centenas de anos tinha-se concedido esta grande honra aos generais ao voltar de uma campanha vitoriosa. Em tais ocasiões, a cidade era entregue durante dias para a marcha de tropas carregadas de botim, e que arrastavam trás de si prisioneiros de guerra, entre os que amiúde havia reis cativos e generais vencidos. Este seria o último triunfo romano, porque celebrava a última vitória romana. Embora tinha sido ganha por Stilicho, o general, foi o imperador menino Honório quem se arrogou o triunfo, entrando em Roma no carro da vitória, e conduzindo até o Capitólio entre o clamor do populacho. Depois, como se costumava em tais ocasiões, houve combates sangrentos no Coliseo, onde gladiadores, armados com espadas e lanças, lutavam tão furiosamente como se estivessem no campo de batalha.

A primeira parte do sangrento espetáculo havia terminado; os corpos dos mortos tinham sido arrastados fora com ganchos, e a arena avermelhada tinha sido coberta com uma nova camada, limpa. Depois disto, se abriram os portões na parede da arena, e saíram um número de homens altos, galhardos, na flor da juventude e força. Alguns levavam espadas, outros tridentes e redes. deram um volta em volta da parede e, detendo-se diante do imperador, levantaram suas armas estendendo o braço, e com uma só voz lançaram sua saudação: "Ave, Caesar! Morituri te salutant!" ("Ave, César! Os que vão morrer te saúdam!").

Recomeçaram os combates; os gladiadores com redes tentavam capturar os que tinham espadas, e quando isso acontecia davam morte, implacáveis, a seus antagonistas com o tridente. Quando um gladiador tinha ferido seu adversário e este jazia impotente a seus pés, olhava para os anelantes rostos dos espectadores e gritava: "Hoc habet!" ("O tem!"), e esperava o capricho dos espectadores para matar ou deixar com vida.

Se os espectadores estendiam suas mãos com o polegar para acima, o vencido era tirado dali para se recuperar, se possível, de suas feridas. Mas se mostravam o fatal sinal de "polegar para abaixo", o vencido devia ser morto; e se este demonstrava má disposição para apresentar o pescoço para o golpe de graça, se gritava o escárnio desde as galerias: "Recipe ferrum!" ("Recebe o ferro!"). Pessoas privilegiadas dentre a audiência incluso desciam até a arena, para poder contemplar melhor os estertores de alguma vítima incomumente valorosa, antes que seu corpo fosse arrastado para a porta dos mortos.

O espetáculo prosseguia. Muitos tinham sido mortos, e a plebe, excitada até o máximo pelo valor desesperado dos que continuavam lutando, gritava suas aclamações. Porém, de repente houve uma interrupção. Uma figura vestida rusticamente apareceu por um momento entre a audiência, e depois pulou atrevidamente na arena. Viu-se que era um homem de aspecto rude, porém impressionante, com a cabeça descoberta e o rosto queimado pelo sol. Sem duvidar um instante, dirigiu-se a um dos gladiadores travados numa luta de vida ou morte, e colocando as mãos acima de um deles o repreendeu duramente por derramar sangue inocente; e depois, voltando-se para os milhares de rostos irados que o olhavam, dirigiu-se a eles com uma voz solene e grave que ressoou através do profundo recinto. Estas foram suas palavras: "Não correspondais a misericórdia de Deus afastando de vós as espadas de vossos inimigos, fazendo-os assassinar-se uns a outros!"

Uns enfurecidos clamores e gritos pronto apagaram sua voz: "Este não é um lugar para predicar! As antigas costumes de Roma devem ser observadas! Avante, gladiadores!" empurrando a um lado o estranho, os gladiadores haviam-se atacado de novo, mas o homem se manteve no meio, afastando-os. E tratando em vão de fazer-se ouvir. Então o clamor se transformou em "Sedição! Sedição! Fora com ele!"; e os gladiadores, enfurecido ante a interferência de um estranho, o traspassaram, matando-o no ato. Também caíram acima dele pedras o um monte de objetos que lhe foram lançados pelos furioso público, e assim morreu em meio da arena.

Seu hábito mostrava que se tratava de um dos eremitas que se entregavam a uma vida santa de oração e abnegação, e que eram reverenciados incluso pelos irreflexivos romanos tão amantes dos combates. Os poucos que o conheciam disseram como tinha vindo dos desertos da Ásia em peregrinação, para visitar as igrejas e guardar o Natal em Roma; sabiam que era um homem santo, e que seu nome era Telêmaco , nada mais. Seu espírito tinha-se sacudido ante o espetáculo dos milhares que se congregavam para ver como uns homens se matavam entre si, e em seu zelo simples tinha tentado convencê-los da crueldade e maldade de sua conduta. Morreu, porém não em vão. Sua obra fica cumprida no momento em que foi abatido, porque o choque de tal morte diante de seus olhos mexeu nos corações da gente: viram o aspecto repulsivo do vício favorito ao que tinham-se entregado; e desde o dia em que Telêmaco caiu morto no Coliseo, jamais voltou a celebrar-se ali nenhum combate de gladiadores.

Extraido de "O Livro dos Martires", John Fox.

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